Você é especialista em Direito Criminal. Possui algum caso predileto?
Na verdade, há um caso que sempre me conquistou e que guardo na memória com interesse mórbido, o caso do 'Der Metzgermeister' (tr., o Mestre Açougueiro), relativamente conhecido no meu meio. Armin Meiwes era um homem com tendências canibais, que encontrava as suas próximas ''refeições'' através do fórum online Cannibal Cafe, um local para pessoas com as mesmas inclinações alimentares. Lá, ele conhece a sua próxima vítima, que consente em ter o seu pênis comido (todo este processo é documentado em vídeo). Porém, Meiwes, pela sua falta de conhecimento, acabou causando a morte do companheiro, ao ter cortado o seu pênis com uma faca — dando aso, claro, a uma hemorragia que se provaria fatal. Meiwes foi condenado por homicídio culposo. A parte mais interessante, para mim, académico, é entender como é que os tribunais alemães poderiam conciliar estas duas ideias aparentemente distintas: o consentimento a ser comido, e a morte de outrem pelo facto a que deu o seu consentimento. Afinal, se o outro consentira, o homicídio era culposo? Havia entre eles uma espécie de entendimento, quase, pelo que o homicídio culposo — ato culposo, doloso, no qual um criminoso cessa a vida de outra pessoa com essa mesma intenção (digo eu, de modo leigo e pouco detalhado) — parece incorreto. Bem, de qualquer maneira, este caso é um que dá aso a debates até hoje. Minha opinião é algo não muito claro, um ''depende'' profundo — afinal, não existe nenhum tipo de legislação ou exceções que se façam ao canibalismo no homicídio culposo, ou sequer menções ao ato de canibalizar outrem na maioria das ordens jurídicas, embora, num geral, partilhe da opinião que é um crime de homícidio culposo: afinal, a vida é o bem último, e, em certas circunstâncias, ter-se-á de considerar que aquele que abdica da vida está debilitado mentalmente, pelo que não disponibiliza plenamente de sua autonomia privada para contratualizar, consensualmente, algo como canibalismo, pelo que aquele que comete o ato de comer outrem, mesmo com o consentimento deste, é culpabilizado (e teria de o ser, seja por homicídio negligente ou culposo — afinal, deu fim a uma vida, ainda que com o consentimento de outrem)... Embora atualmente, muitos códigos criminais já disponham de artigos que mencionem o homicídio a pedido da vítima, muitas vezes usado em casos de suicídio assistido. Não obstante, este caso é um assunto muito interessante para mim, o qual poderia debater por horas e horas.
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